sexta-feira, 12 de julho de 2013

Aliança

Abriu a porta, entrou em casa e deu logo de cara com ela sentada no sofá. Estava apoiada em cima de um de seus pés com o controle remoto na mão apontado para a TV. Logo que o viu, deixou o controle de lado e o chamou para sentar do seu lado.

O barulho da TV lhe soava alto e o cheiro dela indicava que havia saído do banho a pouco. Passou o dia inteiro pensando na versão da história que contaria. Respirou fundo e antes que ela reparasse começou a falar.

Contou que foi sem querer, mas que tirou a aliança do dedo quando foi lavar a mão na padaria em que almoçou e que deve ter esquecido ela na pia. Explicou que se deu conta quando estava no caixa, mas que já era tarde demais, ela não estava mais onde havia deixado.

A expressão dela mudou. Franziu a testa e esticou a perna sobre a qual estava sentada. Começou a falar como se vírgulas não existissem, como se não fosse preciso tomar ar. Foi ficando vermelha conforme ia enumerando os motivos pelos quais não poderia acreditar naquela versão. A voz ia se misturando com as que vinham da TV que seguia ligada. Ele não conseguia se concentrar em nenhuma das duas falas.

Ele tentava argumentar, mas parecia que cada resposta que dava funcionava como mais combustível para ela. Ia emendando uma palavra na outra. Ela não respirava entre as frases. Ele não respirava de medo. Ela não acreditou nele. Mandou ele embora.

E foi assim que aquela noite terminou. Em um ponto da cidade, ela rolando sozinha na cama que era dos dois. Em outro, ele encarando o teto da casa do amigo deitado no sofá da sala. Em um terceiro, uma senhora sentada em sua poltrona sem conseguir dormir, pensando em como encontraria o dono da aliança que sua neta havia pegado na pia da padaria onde almoçaram naquela tarde.

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